Tiago Leifert: a retórica do sucesso

Quem acompanha o “Globo Esporte” de São Paulo há pelo menos dois anos notou algumas mudanças. Desde 2009 no comando da atração, Tiago Leifert mudou o formato do programa aumentando a audiência e ganhando a simpatia do público. Devido ao resultado satisfatório em uma atração local, o apresentador também esteve à frente da “Central da Copa”, que teve exibição nacional e chegou a atingir picos de 46 pontos (durante as partidas do Brasil). Quem viu Tiago na “Central” diante de um computador poderoso que funciona com comandos touch screen e proporciona acesso à internet, agenda dos jogos e vídeos não imagina que a receita do sucesso comunicativo do apresentador já tenha sido ditada pelos antigos estudiosos em retórica.

A finalidade básica da retórica é persuadir o público a fazer alguma coisa. Por se tratar de um programa de TV, a intenção é convencer a plateia de que esse é um bom programa e que todos devem assisti-lo. Para operar com a retórica fazendo com que o auditório seja convencido, é necessário, sobretudo, um bom orador. Aristóteles, grande observador da linguagem humana, disse que para ser um bom orador é preciso saber operar com três meios de persuasão: bons argumentos (Logos), caráter do orador (Ethos) e a emoção despertada pelo orador nos ouvintes (Pathos).

Podemos dizer que o Logos principal do programa é o próprio esporte, desta forma, o melhor motivo para assistir ao GE é ficar por dentro da cobertura esportiva. Como sabemos, brasileiros gostam muito de esportes, e ainda mais de futebol, a paixão nacional; portanto, esse é um bom argumento para se assistir ao GE e isso não mudou com a chegada de Tiago. Se observarmos a figura de Leifert, notamos que, no que diz respeito ao Ethos, ele não se diferencia muito dos outros apresentadores e jornalistas da emissora: é uma pessoa de boa formação (formado jornalismo e psicologia pela Universidade de Miami) e com experiência profissional.

Desta forma, podemos concluir que o grande diferencial do apresentador está no Pathos, considerado por muitos retóricos ao longo dos séculos o mais forte dos recursos. Mas o que seria exatamente despertar a emoção nos ouvintes? Normalmente o conceito de Pathos é associado ao apelo emocional e a comoção, mas a melhor explicação é a de apelo à simpatia da plateia. Um apelo à emoção faz com que o público não só responda emocionalmente ao orador, mas também se identifique com seu ponto de vista, ou seja, o público deve sentir a mesma coisa que o orador. Para conseguir esse efeito, é indispensável ter um contato positivo com o público e uma linguagem em comum.

De acordo com o professor Antônio Suárez Abreu em seu livro “A arte de argumentar”, saber argumentar é, em primeiro lugar, saber integrar-se ao universo do outro e Leifert faz isso muito bem. Diferentemente de antigos apresentadores da atração, Tiago aparece no ar de jeans, camisa e tênis, ou seja, de modo informal como a maioria das pessoas se veste no dia-a-dia, deixando-o no mesmo patamar de seu público e aumentando o grau de identificação. Além disso, ele faz piadas e não lê os textos no teleprompter (equipamento que exibe o texto a ser lido na câmera), o que faz com que o efeito seja o mesmo de uma conversa, como se estivesse ao lado do telespectador. Da mesma forma que muitos dos nossos amigos, Tiago se diverte desafiando convidados para disputas de videogame e zoa com os argentinos como todo brasileiro gosta de fazer – e como diria Aristóteles : “também são amigos aqueles que têm por boas e más as mesmas coisas, e por amigos e inimigos as mesmas pessoas”. Esporte é, em sua essência, uma forma de diversão e Leifert estampou esse espírito no programa: “Esporte não é jornalismo, é entretenimento. É o que faço até hoje”, disse ele à jornalista Carolina Salvatore da revista Época.

Deve-se lembrar que não é apenas na televisão que o carisma faz a diferença. Uma reportagem da Revista Língua Portuguesa (março/2010) trouxe um estudo publicado na Organization Science que mostrava que discursos de executivos carismáticos transmitem aos investidores uma perspectiva mais otimista em relação aos negócios das empresas e ao futuro do mercado. De acordo com a pesquisa, o uso de palavras carismáticas em textos sobre a empresa pode aumentar de 2% e 3% o valor das ações. Saber integrar-se ao universo do outro exige um pouco de atenção e de cuidado, mas é uma boa dica que herdamos da retórica aristotélica. Uma boa ideia é observar o tipo de público que você quer atingir e pensar como ele. Por isso, se sua plateia exige seriedade, a descontração pode ter o efeito contrário.

No entanto, no caso de Leifert a estratégia não poderia ter sido melhor: o fato de o GE ter um jovem e carismático apresentador fez com que a audiência do programa disparasse, atraindo até pessoas que não são fãs de esportes – mas que assistem ao programa na esperança de ver Tiago dançando “Rebolation” ou inventando algum funk.

Fonte:http://observatoriolinguistico.blogspot.com/2010/08/quem-acompanha-o-globo-esporte-de-sao_27.html